sexta-feira, 10 de outubro de 2008

3ª Pergunta

Estamos a viver uma época de rápido desenvolvimento das tecnologias informáticas, com o acesso a redes globais de computadores, ao correio electrónico, a bases de dados, a bibliotecas virtuais, a CD-ROMs, a uma enorme oferta de software, etc. Esse progresso está a provocar mudanças enormes na organização da nossa vida e do nosso trabalho. Como afirma R. C. Heterick [21]: "This is the time to separate confusions and self-deceptions from the truths, and to effect the real information technology revolution. The new technology is not in itself a revolution; the revolution is the diference that technology makes in how we organize, structure, and empower our lives and work places…".
Se pensarmos nestas mudanças e nas implicações que podem ter nos processos ensino/aprendizagem ficamos confrontados com uma série de dúvidas mas também adquirimos algumas certezas. Uma é que o aproveitamento optimizado destas novas tecnologias implica uma mudança drástica das nossas formas de ensinar e aprender. O uso de textos, vídeos e sons (talvez até o aproveitamento de outros sentidos) pode revolucionar os processos de ensino/aprendizagem. A palavra base deste tipo de ensino é "interactividade". Trata-se da mudança de um ensino onde é limitado o papel do aluno na busca de informação e em que ele se tenta adaptar à informação existente (alunos em sítios do interior onde não existem boas bibliotecas e livrarias têm de se conformar a essa situação) para um ensino em que a informação se adapta ao aluno, onde quer que este se encontre. Como afirma R. C. Heterick [21]: "We have been used to a Ptolomaic version of the world in which the technology was at the center and the user of that technology adjusted to the characteristics of the technology… Now people talk of finding a technology that tries to make itself useful, adapt itself to the owner; taking a Copernican view, where the user is at the center, and the technology is used to assist the user".
No actual modelo de ensino, o professor ocupa o papel central, determinando, na maior parte das vezes, o ritmo de aprendizagem. Aproveitando melhor as novas tecnologias nas escolas, o papel do aluno será mais relevante, sendo possível uma aprendizagem mais pessoal, mais rica, mais rápida e com menos custos. O professor terá sempre um papel importante (insubstituível!) na ajuda ao aluno, por exemplo, para o ajudar a seleccionar a informação relevante para um dado propósito. Processos selectivos desse tipo continuarão a ocorrer pela vida fora e é bom que os alunos se familiarizem com eles. Trata-se, sem dúvida, de uma mudança drástica. Como afirma Barbara Kantrowitz [25]: "Under the current model in most developed nations, students are "products" to be processed, similar to a car or a refrigerator. Schools are factories. The finished product is an educated and socially useful citizen. But in the information age, learning will be a lifelong process. The goal should be to train people to be discriminating consumers of the oceans of data that will be available along the Information Highway, whatever form it takes".
Quando se tentam concretizar certas mudanças convém conhecer as resistências que se podem encontrar, para melhor as contrariar. Num artigo de Yvonne Marie Andres [2], as principais resistências detectadas, quando se pensa em concretizar formas de ensino que façam uso das mais modernas tecnologias, situam-se, por um lado, a nível de atitudes e, por outro, a nível da existência, aplicação e partilha de conhecimentos. Como afirma a referida autora, "the electronic frontier is not something that education has embraced with opens arms".
Por questões de atitude entenda-se a tendência natural para desconfiar e rejeitar tudo o que é novo numa dada actividade. É mais simples fazer as coisas como sempre se fez, como se aprendeu, do que aprender novas técnicas para o fazer: "Most of these people (educators) held the belief that the textbook should be focal point of instruction and the primary learning tool". Existe também uma resistência natural de alguns educadores a tudo o que ainda não está provado pedagogicamente: "They wanted 'proof' and lots os statistics to prove that instructional telecomputing is 'worth the time and money necessary to implement it' ". Há ainda a questão do cumprimento dos programas, que leva alguns professores a não usarem nada que saia do âmbito curricular, por muitas vantagens que eles reconheçam nesses "desvios". É claro, finalmente, que existem muitas pessoas que têm simplesmente um receio pré-concebido em relação à própria tecnologia: temem as máquinas, em particular porque pensam que estas podem tomar o lugar dos seres humanos.
Um outro factor de resistência ao processo de inovação baseado no computador é a falta de conhecimentos dos educadores sobre as novas tecnologias e as suas capacidades.
A aplicação prática dos conhecimentos tecnológicos pode também ser um factor de resistência. O professor pode ter os conhecimentos mas não saber como os pode e deve aplicar em situações concretas na sala de aula, por exemplo. O problema da falta de recursos para a aplicação prática é óbvio. Podemos ter educadores com os conhecimentos, e com as ideias sobre a sua aplicação, mas se não existirem as máquinas e o software adequado pouco ou nada se pode fazer.
Finalmente, o outro factor de resistência que foi detectado, no artigo em cima mencionado, reside na partilha de conhecimentos entre os vários agentes educativos. Muitos educadores acabam por não comunicar aos colegas as experiências que realizam na sala de aula.
Outras questões se levantam quando se tenta imaginar a concretização, em particular no nosso país, de um ensino em larga escala que faça uso das tecnologias mais modernas: Qual é a sensibilidade do governo para introduzir estas mudanças nas escolas? Como é que os professores se vão adaptar? De que forma as novas tecnologias se adaptam à realidade das nossas escolas? A relação custo/proveito será favorável?
Em Portugal ouve-se falar, com frequência, dos benefícios do uso de computadores nas escolas: como auxiliares dos docentes na preparação das aulas, como ajuda a um estudo individualizado (permitindo a compreensão dos conteúdos ao ritmo que é próprio de cada aluno) e, mais recentemente, como fonte de acesso a bases de dados e bibliotecas virtuais. Enquanto tudo isto parece fantástico na teoria, a frustação e o desânimo são, de facto, sentimentos que se verificam na generalidade das escolas portuguesas a propósito da utilização de meios computacionais.
Existem algumas razões para tal frustação e desânimo. Por um lado, as escolas não estão, na sua grande maioria, dotadas do material necessário, por não se terem verificado até à data financiamentos suficientemente avultados para esse efeito. Por outro lado, os departamentos governamentais têm-se preocupado mais em colocar material nas escolas, e menos com uma componente essencial do processo que é a sensibilização e a formação dos professores. Ainda recentemente, na Escola EB123 Gualdim Pais de Pombal, onde trabalho, uma professora pedia "desesperadamente" uma máquina de escrever a uma das funcionárias para poder dactilografar uma certa ficha de trabalho. Quando lhe disse que existiam seis computadores livres na sala onde nos encontrávamos, ela respondeu que não se sentia à vontade com os computadores. Um outro professor presente acrescentou que, com o computador, se demorava mais do que de outra maneira, referindo que tinha demorado um serão a escrever quatro páginas de uma acta. Quem trabalha nas nossas escolas sabe que algum do material que lá existe não é utilizado, porque os professores não o sabem usar. A falta de informação é tal que chega a existir material informático que não se sabe sequer para que serve. Os casos referidos revelam bem uma falta de preparação dos professores para o uso de tecnologias diferentes daquelas em que foram educados. Este problema é comum a vários países. Como confirma Barbara Kantrowitz [25]: "Inadequate teacher training has also been a huge obstacle. Too often, computers gather dust because teachers don´t know what do with them". São apenas alguns, poucos, professores, que por meio da partilha dos seus conhecimentos e experiências, vão lentamente concretizando algumas mudanças nas suas formas de ensinar.
Nos cursos de formação educacional nas universidades, existem já certas disciplinas onde se ensinam os alunos a programar e a trabalhar com as novas tecnologias (por exemplo, os alunos de Física do ramo educacional, na Universidade de Coimbra, têm no seu currículo uma cadeira de "Uso dos Computadores no Ensino" e os alunos do Mestrado em Ensino da Física, da mesma Universidade, têm uma unidade sobre esse tópico). E os outros professores, os que já estão no sistema e que nunca tiveram oportunidade de aprender a trabalhar com computadores? Para todos estes, o Ministério da Educação julga que resolve rapidamente o problema disponibilizando alguns computadores. Quem vive de perto os problemas de uma escola sabe que tal solução não resolve nada. Não é com uma mão cheia de computadores e alguns programas que se altera toda uma situação de falta de prática. Há que ensinar os professores a manejar minimamente os computadores e a trabalhar utilmente com eles. Tem, concerteza, de se fornecer equipamento adequado às escolas, mas não se deve esquecer essa componente não menos importante para a mudança pretendida que é a formação dos professores. Citando um velho ditado chinês: não basta dar o "peixe", há também que ensinar a "pescar".
Sem essa formação adicional para lidar com as novas tecnologias, os professores acabam por "arrumar" os computadores numa sala. Esta sala é designada por "sala de computadores", enfatizando assim o isolamento entre o cenário da máquina e o da verdadeira aprendizagem, que só ocorrerá nas salas comuns. Os computadores passam então a ser vistos mais como um meio de ajuda no processamento de um texto, na elaboração de um cartaz ou apenas como um simples passatempo. Ainda há muito a fazer para que o computador seja integrado na sala de aula como uma ferramenta, tal como a caneta, o papel, o quadro ou o vídeo [25].
Compete aos vários intervenientes do processo educativo mudar esta situação. Aqueles que têm mais facilidade em lidar com os computadores podem e devem transmitir os seus conhecimentos aos colegas, mostrando-lhes as potencialidades das máquinas nas salas de aula, bibliotecas, salas de estudo, etc. Competirá ao Ministério da Educação (ou ao Ministério da Ciência e Tecnologia?) promover ou apoiar acções de formação sobre as novas tecnologias computacionais nas escolas. Essas novas tecnologias reúnem todas as condições (aplicações multidisciplinares, rapidez de informação, etc.) e criaram elas próprias condições na sociedade (referência constante nos orgãos de comunicação, uso doméstico bastante divulgado, etc.) para que as acções de formação deste tipo obtenham a adesão dos professores e permitam realizar mudanças no ensino.
Quanto à relação custo/benefícios, embora ela seja difícil de quantificar, os indicadores são positivos nos países que estão a realizar tais mudanças. Como refere R. C. Heterick [21]: "Estimates now tells us that we´re looking at a 15 to 25 % improvement in cost/performance annually… we´re going to continue to see same kinds of price/performance improvements. This may be an offset to systematic financing problems in education."
Uma questão sempre presente, pelo menos a nível do subconsciente dos docentes, é a seguinte: será que os computadores vão tornar os professores dispensáveis? Claro que a resposta é não. Os bons professores nunca serão substituídos pelas máquinas. A tecnologia nunca há-de substituir a relação humana entre o professor e o aluno. Mas as máquinas podem ajudar os professores e os alunos tanto na sala de aula como fora dela. Em particular, os computadores ajudam como ferramentas auxiliares na sala de aula para ensinar e aprender. Como afirma Barbara Kantrowitz [25], "computers expand the classroom walls - and a student´s horizons".
Quais serão os reais proveitos de um ensino que se serve dos computadores e de outras tecnologias associadas?
Desde que se assegure a motivação e a formação dos professores haverá muito a ganhar. Com o uso de computadores nas salas de aula, bibliotecas e salas de estudo, o aluno ocupará um papel mais central no processo de ensino/aprendizagem, sendo o seu ritmo mais respeitado e desenvolvendo-se uma aprendizagem mais eficaz e sólida. Segundo R. C. Heterick [21]: "Information technologies have extraordinary potential for changing the way people learn, and changing it in such a way that they learn more, and learn more quickly, and interestingly enough, that they do it at less real cost". Por outro lado, o ensino será mais moderno e dinâmico com o recurso por exemplo às potencialidades dos meios multimédia.
Com as redes de computadores e as novas tecnologias de comunicação, os estudantes aprendem a pensar como cidadãos da "aldeia global", vendo o mundo, e o seu lugar nesse mundo, de uma forma bastante diferente da dos seus pais. A informação circula agora livremente ultrapassando fronteiras de vários tipos (sem intermediários que decidem o que é notícia, o que é importante, o que é bom para nós, o que é arte ou o que é diversão), percorrendo todo o mundo directamente de onde aconteceu o facto até onde estiver alguém que dele queira ter conhecimento. Em muitas circunstâncias, a informação que não é filtrada, seleccionada, comentada ou interpretada torna-se mais pessoal e, consequentemente, mais real. E podemos realizar experiências pessoais muito enriquecedoras: conversar com professores e alunos da Austrália, dialogar com cientistas do CERN ou da NASA, visitar museus e institutos dos Estados Unidos ou do Japão, etc.
Uma vantagem também óbvia é a diminuição das desigualdades entre os alunos do interior e os dos grandes centros, para não falar das diferenças entre países. Com a possibilidade de acesso à Internet, com todos os serviços que ela disponibiliza, e também com o uso de CD-ROMs, todos os alunos podem ter acesso a informação muito mais variada.
Estas mudanças vão necessariamente ocorrer, mais cedo ou mais tarde, sob o risco, se tal não acontecer, da escola se afastar perigosamente da sociedade, ficando mesmo à margem dela.
Com professores sensibilizados para o uso das novas tecnologias, as mudanças serão necessariamente mais rápidas. As estratégias de ensino e aprendizagem irão evoluir mais rapidamente. Os estudantes, ao comunicarem com pessoas em locais mais ou menos distantes, começam a compreender, a apreciar e respeitar as semelhanças e diferenças entre línguas, culturas e políticas. Interiorizam que não interessa a raça, o aspecto físico e o nível social, mas sim a troca de ideias e conhecimentos e o valor de algumas dessas ideias e conhecimentos. A visão do mundo e do lugar que nele ocupam vai-se forçosamente alterar. Os estudantes serão levados naturalmente a pensar em assuntos de interesse global. Al Rogers [40], acerca da troca de vivências entre estudantes de vários pontos do globo, escreve:
"Students in Europe and America find out from children in Israel what a Scud attack is really like".
"Students in Southern California learn from children in Santa Cruz, California, what they did to do to prepare for an earthquake … lessons learned from bitter experience".
"Students in New York collect relief supplies to send to their online friends devasted in the Florida hurricane"
Os alunos de uma certa escola podem utilizar os computadores para escrever histórias reais ou imaginadas, aplicar ou reforçar determinados conceitos com o recurso a software adequado, e complementar na biblioteca um dado assunto abordado nas aulas servindo-se de um CD-ROM, aconselhado pelo professor, contendo textos, imagens e sons. Mas a possibilidade de os alunos trocarem experiências com outros, de diferentes escolas do mesmo país ou de diferentes países, reforça a necessidade de se saberem exprimir bem por escrito, assim como de aprenderem línguas e culturas diferentes.
Num estudo realizado por Cohen and Riel [11] concluiu-se que, quando os alunos escrevem para uma audiência distante e desconhecida:
são mais espontâneos,
são mais organizados,
as ideias são mais claramente expostas e fundamentadas,
os conteúdos são mais ricos e fundamentados,
existe uma preocupação em respeitar os limites e as necessidades da audiência.
No mesmo artigo são referidos testemunhos de professores que participaram nesse tipo de projectos, e onde notaram que:
existia um maior interesse pela escrita;
os estudantes revelaram cuidado na escrita, na apresentação e na execução dos trabalhos;
os estudantes mostravam-se cuidadosos na pontuação, na gramática e no vocabulário.
É para todos um novo mundo que se abre para lá dos muros da escola.

Fonte: http://nautilus.fis.uc.pt/softc/Read_c/destaque/enstec.htm

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